sexta-feira, 21 de maio de 2010

Telefonema.



Alô? Oi...que engraçado, não sabia que você tinha secretária eletrônica. Liguei para... bem, não sei porque liguei. Já não nos falamos desde... bem, desde o ocorrido. Nossa, meus dias têm sido muito estranhos. Saio para trabalhar, estudo, volto para casa. Sem nenhuma novidade. Sabe, ontem vi um cara sendo assaltado, outro bêbado cantarolando na praça e uma mulher carregando seis gatinhos. Fiquei com medo pelo assalto e pelos gatinhos, você sabe que eu prefiro enfrentar dragões e monstros do lago a enfrentar esses animais fofinhos e grudentos. Bem... comecei a fumar. Ok, sei que não devia, mas passar o tempo dentro desse apartamento vazio, mal cheiroso e repleto de lembranças não me deixa outra escolha. E minha família e meus amigos – nossos amigos – arrumaram afazeres melhores do que cuidar de mim. Ah...tenho uma notícia boa! Comecei a faculdade e o cursinho de inglês. Se lembra que meu sonho era me formar e fazer uma viagem ao redor do mundo? Você sempre me dizia que não era possível sair por aí sem saber o tal idioma universal. Pois é, o idioma eu estou aprendendo, só não vou realizar meu sonho, afinal não tenho dinheiro para isso, e minha companhia partiu e não voltará mais, já que tem um novo amor e filhos para cuidar. Por falar nisso, como vão eles? Um dia passei perto do colégio, e os vi atravessando a rua em direção ao transporte escolar. Que lindos! O mais velho sempre segurando a mão da irmã. Júlia é o nome dela, certo? É o nome que sempre sonhamos para nossa menina, aquela que eu não pude te dar. [ pausa longa, e alguns soluços de choro ] Desculpe deixar esse recado enorme, mas essa noite sonhei com você. Não foi bem um sonho, foi só uma lembrança... foi sobre aquele dia em que fomos ao parque e comemos frutas na beira do lago, até que começou a chover e tivemos que ir embora antes do previsto. [risos] Aquela foi a melhor tarde da minha vida. [pausa] Ah, só para saber, cortei meu cabelo. Sei que você o amava como era antes, mas estava me dando trabalho e aquela antiga vaidade saiu por essa porta logo depois de você, então o cortei até os ombros. Ops, o microondas apitou, e estou com muita fome, nem me lembro qual foi a última vez em que me alimentei, acho que é hora de desligar... Liguei só para saber como estava, para dizer que não estou vivendo bem sem você mesmo depois de todos esses anos, mas que continuo lutando todos os dias por um futuro melhor, e principalmente, para que você não se esqueça de mim. [voz baixa e trêmula ] Er...dê um oi para sua mulher e seus filhos...espero que fique bem. E não se preocupe, não te procurarei mais. Eu amo você, se cuide, por mim.


Rayanne Castro.

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